Monday, December 05, 2005

O fantasma das normas de qualidade ISO, e a sua imposição futura, ou não...

Tinha estado em coma durante uns anos e acabava de regressar à minha terra, como sempre, lá fui procurar o Ti Jerónimo para tomar o meu cafézito da manhã, qual o meu espanto quando no lugar do Ti Jerónimo encontro um café novinho em folha, com o chão brilhante mesas impecáveis, balcão envidraçado, fantástico, perguntei pelo Sr. Jerónimo, responderam-me que já não era ele o dono do café, “sabe, teve que sair, não estava preparado para estas tecnologias, isto agora é um café com certificação ISO 2015 por obrigatoriedade da Delegada de Saúde e não se pode facilitar em determinadas atitudes, quer dos clientes quer dos proprietários, temos que cumprir com as regras estabelecidas no sentido de defender o consumidor, se não fecham-nos a porta”.
Não me agradou minimamente toda aquela etiqueta e cuidados, para não quebrar as regras impostas por essa tal certificação ISO não sei das quantas, fui até ao amigo Jeff onde me sentiria certamente muito mais à vontade, no meio de algumas beatas de cigarro no chão e manchas de tinto na mesa, pois imaginem a surpresa, quando me disseram que o “Jeff” já não existia, segundo comentaram, não foi possível converter o seu café para algo apresentável, que respeitasse os mais altos padrões de qualidade sendo obrigado a encerrar.
Cada vez mais surpreso, passei pelo centro à procura da “Matilde”, mas a história repetiu-se, café novo, todo “polido”, chão a brilhar, mesas e balcão irreconhecíveis. Não era permitido fumar, havia que respeitar os outros, não se podia conversar demasiadamente alto, poder-se-ia ir contra os limites de décibeis permitidos pela tal norma ISO 2015, o café tinha sido obrigado a reduzir o seu espaço para arranjar casas de banho para senhoras e para senhores heterossexuais, para senhoras e senhores homossexuais, para deficientes e para crianças, existiam uma série de princípios que os proprietários eram obrigados a solicitar aos seus clientes, além de umas largas dezenas de normas de qualidade e segurança, que visavam defender-nos de possíveis faltas de qualidade no serviço que nos era prestado.
Aqui fartei-me, sem pensar mais, passei por casa de uns amigos, e fomos para a adega do meu sogro berrar uns com os outros, fumar, sujar o chão, beber uns tintos acabados de tirar da cuba (sem qualquer selo da Direcção Geral de não sei quem), comer carne acabada de assar em cima das brasas, cortar um belo presunto que o meu sogro tinha guardado do último porco que tinha conseguido matar sem ser multado, e terminamos com um belo bagacinho que ele próprio tinha destilado (os alambiques tinham sido encerrados por não apresentarem a qualidade necessária), em resumo divertimo-nos imenso...
Felizmente passado pouco tempo acordei e percebi que tudo isto não tinha passado de um sonho, ainda posso ir ver a bola ao Ti Jerónimo, beber um copo na Matilde ou comer um coelhito no cantinho. Graças a Deus, que ainda nos vão permitindo, ter o nosso próprio sítio, mais sujo ou menos limpo, mais iluminado ou menos escuro, mais cheio de fumo ou menos arejado, mas o nosso espaço onde nos sintamos bem e façamos aquilo que nos dá na real gana, respeitando sempre a liberdade uns dos outros sem que isso nos seja imposto ou catalogado, porque no futuro meus amigos, não sei nos vão deixar ter isso, com esta mania actual do protecionismo excessivo!!
Cada um, só frequenta os sitios onde se sente bem e não é preciso alguém vir dizer como é que eu me vou sentir melhor e mais protegido em determinado sitio, se não gosto ou não confio, não vou.

9 comments:

JL said...

Pois é amigo north, tens razão, ainda bem que foi só um pesadelo.
Mas este artigo fez-me lembrar o que vi em Paris, há um ano atrás, quando lá estive em visita. Em plena cidade da Luz encontrei uma feira ou mercado onde se vendia carne e peixe sem as protecções e o sistema de frio que aqui se exige. Tal e qual o que se passava nas nossas feiras e mercados há uns belos anos. Fiquei espantado como é que tal era possível. Aquilo era de um país terceiro mundista! Pelo menos foi por este motivo que se impediram os comerciantes de vender assim cá no burgo. Depois pude constatar que os vírus e bactérias lá não são, afinal, tão potentes quanto od de cá. E também falam francês. Enfim, manias!

Neoarqueo said...

Olha North, está soberbo...simplesmente soberbo. Eu sempre disse, alto e bom som, que tu eras um génio, o teu irmão, aquele que te ostraciza em função do outro é que julga que não. Julga que ele é que é o génio, só porque tem a mania que é o mais velho. Adorei a forma irónica com que manifestas a tua e também minha rebeldia para com o "establishment". Abaixo a porcaria das normas ISO e outras merdas idênticas. Os Restaurantes não podem utilizar colher de pau...Os gajos da Europa são burros, mas mais burros são os pacóvios dos nossos tecnocratas que aceitam tudo isso com um ar de "burros espantados" e comem a palha toda que lhes é atirada´`a má fila lá das franças e alemanhas. Eu queria ver se a colher de pau fosse uma invenção deles se ousavem retirá-la...Consola-me o facto de eles nem capacidade terem para utilizar tão simbólico objecto. Quando cá vierem com mais ISO's haviam de ser corridos á Pazada pela Padeira de Aljubarrota...cambada de ISOtéricos. Ahhh!!!

Anonymous said...

Os cafés das aldeias são um bem a preservar e uma riqueza social que porcaria nenhuma de ISO pode destruir.
Conheço um tasco numa aldeia de outro concelho que até o grande bigode da proprietária lhe dá um toque especial.
Eu cá também gosto é do genuíno e não das paneleirices, na maoria das vezes, infundadas das ISOmerdas.
Também gostei de ler.

Unknown said...

Tivemos que esperar mas valei a pena. O teu pesadelo ISO fez-me lembrar a colher de pau, que por norma imposta pelos chefes, também eles certificados – ISO 9000, foi retirada das cozinhas tugas. Eu, o Sr. Barrigana (tsfm), o JL e o Velho ainda hoje nos deliciámos com um belo bacalhau com grão e uma dobrada, numa tasca onde as normas ISO, se alguma vez vencerem, vão tirar todo o sabor e ambiente.
Qualquer dia temos um carimbo redondo no nosso órgão reprodutor para que as nossas parceiras saibam se estamos certificados para o prazer ou para a reprodução.

O artigo está cinco estrelas, mas estás a baldar Deuses e Vinho Tinto.
Um abraço

north said...

Não estou não!

Alex said...
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Alex said...

Parabéns pelo Blog
Este Post também está demais...
Confesso que já estava a ficar assustado com essas normas ISO.
Ele agora é cada número!...
Apesasr de existirem essas normas todas, já mandei muita comidinha de volta para a cozinha em restaurantes e também já apanhei algumas intoxicações alimentares. Algumas em casa.
Há pessoal que para ganhar mais dinheiro se está a marimbar para tudo que é normas.
Devia haver mais fiscalização e multar bem esse pessoal ou até em alguns casos mete-los dentro.
Um abraço

Anonymous said...

Concordo com "iso aí"
Esses "gaijos" têm a mania! E "inda" nos querem "inducar".
Viva o antigo, deitem as normas porta fora, queremos é sentir as pessoas puras à nossa volta.
Até já dizem que não se pode matar o porco em casa, mesmo para consumo familiar ... olha esta ... então e se o porco morrer sem mais nem menos? podemos dizer " eu só estava a empurrar o porco com esta faquita e a dizer - Olha que ainda te espetas! ele não quiz saber!."

Alex said...

Terreiro, és capaz de ter razão.
"O que não mata engorda..."